Cresci nos anos 80, em plena ditadura militar. Mas filha de pai caminhoneiro e mãe dona de casa, política não era um tema discutido na mesa do jantar. Por isso só tive contato com os horrores do regine quando fui fazer o colegial (atual ensino médio) com professores “subversivos” formados em universidades públicas que substituíram as aulas de educação moral e cívica por história do Brasil. E foi quando meus olhos e coração se abriram.
Não tive vizinhos comunistas, nem pais de amigos desaparecidos nos porões da ditadura. Não conheço ninguém que foi torturado ou que tenha dado abrigo a fugitivos vermelhos. Mas isso não me impede de querer distância de qualquer coisa que lembre, ainda que de forma distante, os anos de chumbo.
Por isso, embora tristemente surpresa com as milhares de pessoas que lotaram ontem a Avenida Paulista para pedir o impeachment de um governo eleito democraticamente pela maioria da população, meu horror maior foi constatar a quantidade de gente defendendo a volta dos militares ao poder. Gente mais jovem do que eu, gente mais velha do que eu. Mas gente que acredita piamente que os anos de chumbo é que foram bons! Gente que defende o fim dos partidos políticos e pasmem, do Supremo Tribunal Federal, embora defenda a indicação de Joaquim Barbosa para presidente militar!
Envergonhada, confesso que não fui às ruas pedir Diretas Já, distante que estava da fervura social da época, morando em uma cidade do interior paulista onde tudo parecia dentro da normalidade. Também não fui cara pintada. Aos 43 anos, ontem foi a primeira manifestação que participei – ainda que a trabalho.
Consegui manter minha imparcialidade como jornalista – papel que eu realmente acredito que todo profissional deve ter. E ainda que triste, gosto de pensar que essas milhares de pessoas só estavam lá porque vivemos em uma democracia – e sujeitos a tudo que ela traz.